Coisas fora do lugarPor Charles Nisz | Lixo – nova legislação e coleta seletiva, foi o tema do debate de ontem (15) na série Encontros Estadão e Cultura, conforme antecipei no post anterior. Denis Bugierman (jornalista e editor do blog Isso não é normal), Luiz Gonzaga Pereira (presidente da Loga Logística Ambiental) e Sergio Alves (Secretário Adjunto e Diretor do Departamento de Limpeza Urbana – Limpurb) discutiram o tema. O título do post é inspirado pelo economista Paulo Sandroni, da FGV. Para ele, “não existe lixo, existe matéria-prima fora do lugar”. Considero um excelente ponto para começar uma discussão sobre o descarte, reciclagem e destino final do lixo produzido nas cidades. Mas o problema não é novo: já no século XVI havia registros de lixo jogado nos arredores da vila de São Paulo. Todos os dias, São Paulo produz 17 mil toneladas de lixo – cerca de 1,5 quilos para cada um dos 11 milhões de habitantes. Para acondicionar esse lixo é necessária uma área equivalente a 270 campos de futebol com 50 andares de altura, contou Bugierman. Sim, os números impressionam e assustam. Mas essa numeralha não é o ponto crítico: dessas 17 mil toneladas, apenas 1% será reciclada. Pereira traz os números apurados pela Loga Logística, responsável pela coleta em metade da metrópole: a cada dia, apenas 60 das seis mil toneladas coletadas pela empresa serão recicladas. Apesar do esforço de 45 mil catadores de lixo, 150 cooperativas, além das ações individuais, São Paulo recicla apenas 20% do lixo produzido. O poder público recicla apenas 1% das 17 mil toneladas diárias. Não à toa, a dissertação de mestrado de Sérgio Alves, diretor do Departamento de Limpeza Urbana tem o título de “Estado poluidor”. O diretor dá um exemplo das dificuldades enfrentadas na gestão do lixo: “Gostaria de acabar com documentos internos e memorandos, mas não há um esquema de certificação digital. Sou obrigado a assinar um documento em quatro vias e mandar um motorista levar os papéis do Canindé ao Ipiranga”. Parece um absurdo saído das páginas de Kafka… A primeira pergunta a ser feita: por que São Paulo não tem uma agência reguladora para gerenciar e fiscalizar o lixo? A segunda questão: como educar e integrar esses 45 mil catadores às cooperativas de modo rentável? Para esses trabalhadores, é mais lucrativo permanecer na informalidade, explica Alves. Parenteses rápido, sobre os catadores: a situação irregular deles impacta também o (já caótico) trânsito de São Paulo. Consideradas veículos, as carroças são registradas no Detran. Ou seja, são 45 mil veículos a mais nas ruas – 1% da frota paulistana. Há inúmeras questões a serem resolvidas quanto às cooperativas de reciclagem de lixo. Pereira aponta os problemas no licenciamento ambiental desses espaços como a maior dificuldade. Mas há esperança: a Defensoria Pública entrou com uma ação civil e a Prefeitura tem prazo de um ano para regularizar a coleta. São Paulo gasta pouco do seu orçamento com a coleta de lixo. Dos R$ 29 bilhões do orçamento da cidade, apenas R$ 1,1 bilhão são gastos com a limpeza. É apenas a 18a colocada no ranking das metrópoles globais. Para se ter idéia, são apenas 36 fiscais para fiscalizar esse sistema em toda a cidade. Isso para não falar nas oportunidades de negócios jogadas, literalmente, no lixo. Acondicionar os restos em sacos é anti-ecológico e ineficiente. Pareira sugere o uso de conteineres, facilitando o transporte do material. Bugierman traz exemplos de outros países: no Japão, os sacos de lixo são caríssimos e isso obriga as pessoas a produzirem menos lixo. Nos EUA, equipes da limpeza urbana “investigam” o seu lixo e quem não separa o lixo de maneira adequada é multado. Por outro lado, quem produz menos lixo, recebe desconto no seu imposto. O índice de reciclagem em Nova York é o dobro da capital paulista. Compostagem foi outro tema importante lembrado por Bugierman nessa discussão. Boa parcela do lixo poderia ser usado para produzir adubo caseiro. É bem apropriado pensar nisso quando o consumo de fertilizantes industriais aumentou em 5% em relação ao ano passado. Não basta olhar o passado, precisamos pensar qual cidade queremos para o futuro. A Copa de 2014 demandará várias mudanças na infra-estrutura urbana e a gestão do lixo precisa ser prioridade. Vamos lembrar que a revitalização de Barcelona foi impulsionada pelos Jogos Olímpicos. Deixo, por fim, mais uma questão para vocês. Um assunto não abordado nesse tema é a expansão da “fronteira do lixo”. Nos EUA, a cada ano são necessários mais 1400 hectares para armazenar o lixo. Num mundo onde há muita especulação territorial, é desperdício gastar terreno para gerenciar (mal) o lixo. Não há dados sobre a velocidade dessa expansão aqui no Brasil. Mas tentem imaginar o quanto estamos perdendo cada vez que abrimos um terreno para criar um aterro sanitário. Se você tem dados sobre a gestão do lixo no País, deixe nos comentários deste post. Este post foi publicado emSem categoria e tags brasil, carros, catadores, compostagem,gestão, lixo, reciclagem, são paulo, trânsito. Bookmark o permalink. Comentar ou deixar um trackback:Trackback URL. |
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
Não existe lixo, existe matéria-prima fora do lugar.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Parabéns!!!
ResponderExcluirFaço parte da Agenda 21 Macro Leste, apesar de morar atualmente em Sto André (não consigo contato com ninguém da Agenda ou outra Rede Social no ABCD...
Espero que possamos ter contato nesse ano, e que o novo secretário do meio ambiente, seja daqueles que plantam, sem medo de sujar as mãos com terra e água, e tire o migrante das encostas para levá-lo com honra e dignidade de volta ao lar... e se misture com as pessoas humildes, seguindo o exemplo do ex-presidente... etc etc etc