Prezado Wilson Quintaneiro, Li com muito prazer suas reflexões sobre o que fazer com o lixo (link abaixo). São deliciosas as lembranças sobre a época em que o lixo não era problema, ao contrário da grandeza e complexidade dos problemas atuais. Quero, no entanto, respeitosamente discordar de suas sugestões sobre a incineração; a forma de gestão e tratamento de lixo que escolhemos provoca diferentes impactos sociais e ambientais. Você diz que todos os materiais devem ser recuperados e reciclados prioritariamente e o "resto" incinerado. Aparentemente faz sentido, parece ser uma idéia razoável. Mas só aparentemente. Mas até mesmo essa idéia, de incinerar o “resto”, aparentemente razoável, não resistiu ao lobby feito no Senado, na recente aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.Mas afinal de contas, quais são os problemas com a incineração? Um Deputado do Estado de São Paulo costuma dizer que Deus recicla e o Diabo incinera. Não se trata de discutir religião, mas de atentar que o Diabo mora nos detalhes. Alguns argumentos que apresento abaixo são do Dr. Paul Connett, Profesor de Química e toxicologia ambiental da Universidad de St. Lawrence, facilmente acessível na Internet. Costuma-se lembrar que em outros países a incineração é uma pratica popular e bem aceita. Não é bem assim. Nos Estados Unidos, Alemanha, Japão, França as tentativas de expansão desse sistema encontram forte resistência da população. Não é por acaso. O Japão, por exemplo, que tem muitos incineradores em operação é o maior emissor mundial de Dioxinas. Mas o problema não são apenas as Dioxinas, que lentamente vão se acumulando nas pessoas, animais e meio ambiente Há outros subprodutos formados durante a incineração que sequer são conhecidos seus impactos sobre a saúde pública e o meio ambiente. Mas esqueçamos as dioxinas e os demais subprodutos. Para as emissões que são parcialmente conhecidas é preciso que existam regras específicas, monitoramento adequado e forte controle para que se cumpram essas regras. Nas precárias condições de gestão dos resíduos dos municípios e da maioria dos estados brasileiros, que o senhor tão bem descreveu, é bem provável que o controle rigoroso seja uma quimera. Mas esqueçamos os prováveis problemas de monitoramento e controle. De um melhor controle das emissões dos gases decorre que mais metais pesados e dioxinas vão parar nas cinzas. Então, de três toneladas de lixo incinerado, criamos uma tonelada de cinzas perigosas, que devem ser destinadas a um aterro especial. Mas esqueçamos que a incineração cria resíduos perigosos. Pode-se gerar energia elétrica a partir do lixo. Para um mundo sedento (e embriagado) de energia (a maior parte destinada a manter uma forma de vida insustentável), é uma proposta pra lá de sedutora. Mas há um engano aí. Gera-se bem pouca eletricidade. Se pode economizar em torno de 4 vezes mais energia reutilizando, reciclando ou compostando os mesmos materiais que seriam incinerados; como esses não retornam à cadeia produtiva, é preciso substituí-los pela extração de matérias primas, que consome energia e contribui para o aquecimento global. Mas esqueçamos que há formas mais econômicas de se economizar energia. A implantação de incineração irá gerar postos de trabalho formais, preferencialmente para catadores. É verdade. Mas o número de empregos gerados pela recuperação de materiais face aos gerados pela incineração são mais de 600 vezes maiores nos Estados Unidos (Institute for Local Self-Reliance, 1997, citado em: Tangri, N. (2003), Waste incineration: a dying technology. Berkeley: GAIA) e tende a ser maior no Brasil, onde a mão de obra é significativamente mais barata e onde há um extenso setor informal já atuando nessas atividades. No Brasil, trabalham aproximadamente 1 milhão de catadores e catadoras. A maioria desses trabalha de forma autônoma e o restante está inserido em cerca de 500 organizações. Hoje, aproximadamente 2% dos resíduos sólidos domiciliares são reciclados no Brasil, estamos apenas no início da expansão deste setor. Podemos esquecer das dioxinas e outros subprodutos; dos problemas de monitoramento e controle; da produção de resíduos perigosos; de que há formas mais inteligentes de economizar energia; até mesmo de que a incineração irá fragilizar ainda mais a situação de 1 milhão de catadores e catadoras. Só não podemos esquecer, caro Senhor Wilson, de nos posicionarmos firmemente, assim como o senhor fez. Abraços, Dan Moche Schneider f 13-34264832 c 11-91094431 Skype dan.moche.schneider |
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
Brilhantes considerações -O luxo do lixo (Wilson Quintaneira
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